domingo, 28 de novembro de 2010

ONDE FOI PARAR A GUERRA?



O Rio de Janeiro viveu uma semana inesquecível, a última do mês de novembro de 2010. Tivemos fogo, explosões, medo, pânico e muita rede globo.

De repente, bandidos passaram a queimar carros em vários pontos do Rio. A primeira declaração de um delegado foi: “Temos a certeza de que não se trata de algo organizado...”. Bem, claro que ele estava mentindo.

Com o passar dos dias o número de carros, caminhões, ônibus queimados a qualquer hora do dia cresceram, saíram da casa da unidade para a da dezena. Chegou num ponto em que a cidade começou a sentir medo. Boatos começaram a pipocar, e duas caixas suspeitas, deixadas em Ipanema, mobilizaram o esquadrão anti bomba e dezenas de desocupados que passavam pelo local. Não havia perigo, era uma campanha publicitária. Por isso, alguns dizem que a publicidade é o mal do mundo.

Finalmente, as forças policiais, incluindo polícia militar, civil e a Marinha resolveram colocar em prática um plano fantástico, uma ação conjunta. Uma ação um tanto óbvia, não? Resultado, a população, que já vivia o clima de pânico generalizado por não agüentar mais ouvir a respeito dos ataques marginais que queimavam carros a torto e a direita, passou a ficar um pouco pior, pois a força conjunta dava entrevistas e falava que invadiriam a famosa Vila Cruzeiro.

Bem, a guerra psicológica, alimentada pela cobertura da rede globo (principalmente), deu certo. Empresas liberaram funcionários mais cedo, escolas não abriram, trens mudaram itinerários etc. A audiência foi lá em cima.

Nada na Globo é mínimo. Quando eles decidem explorar um assunto, ninguém segura. Não teve para Datena, Wagner Montes ou qualquer concorrente. A maior parte dos televisores estava ligada na tela do plim plim.

E assim, no dia 26 de novembro, todo mundo pôde acompanhar os repórteres e apresentadores de telejornais globais tendo suas horas e mais horas e mais horas de fama.

o clima:

A polícia, contando com blindados da Marinha, invadiu a Vila Cruzeiro. O senhor Pimentel, que além de inspirar o comandante Nascimento do Tropa de Elite 2, faz um bico como explicador no RJ TV, chamava a atenção para o que a polícia encontraria... muita resistência. Afinal, eram cerca de 700 bandidos fortemente armados, com táticas de guerrilha, que, segundo sua análise crítica, não se entregariam.

Lá embaixo, o hospital Getulio Vargas fora preparado para receber os feridos em combate; diversas ambulâncias haviam sido preparadas para o pior; helicópteros sobrevoavam a região... a tensão crescia. Toda a programação da Globo foi cancelada para transmitir esse confronto épico.

Mas... depois de horas de um falatório retórico, nada aconteceu. Até que... uma imagem capturada pelo Globocop, claro, flagrou algo. Eram... os bandidos (parecia um bando de adolescentes correndo atrás de doce em dia de Cosme e Damião), correndo desesperados por uma estrada. Eram centenas. Os bandidos temidos eram toscos, monstros construídos de maconha e cocaína, que seguiam as ordens de outros vermes sociais, caso do tal Elias Maluco. Maluco era quem seguia essa ‘coisa’. Os traficantes realmente estavam armados, mas mal conseguiam segurar as armas enquanto seguiam rumo ao complexo do Alemão.

Bem, a Globo conseguiu um furo de reportagem. Pois essa fuga foi a única coisa digna de registro. Tanto que a imagem era reprisada de 10 em 10 minutos. Quem não estava atento ao áudio achou que milhares de bandidos estavam em fuga. Ah, a Globo foi proibida pelo BOPE de mandar esse helicóptero de novo para mostrar o que a polícia não viu. E as imagens já estão à venda nos camelôs de sua confiança, com o nome de Tropa de elite 3... deve ter os comentários do Pimentel.

E assim, no dia seguinte, foi a vez de mostrar a expectativa da guerra que não houve. Mas, segundo Pimentel, o homem sábio, dessa vez os meliantes não se entregariam sem luta. Pois não havia como fugir pelo lugar de onde vieram, uma vez que as forças policiais dominaram a região da Vila Cruzeiro com extrema facilidade.

E lá foi a rede globo cancelar toda a programação de domingo, pois no sábado houve apenas mais retórica e infográficos. Desde as 8h repórteres se revezaram para transmitir o incrível combate, agora seria no complexo do alemão. Olha, pior que Pimentel só o Alex Escobar. NÃO HOUVE COMBATE!!!

A polícia invadiu, jogou cartas, brincou de pique-esconde e tomou conta do local. Os bandidos simplesmente sumiram. Alguns foram presos, outros serão ao longo da semana, meses etc. Pra quem esperava e anunciava uma guerra, foi deprimente reportar que morreram apenas dois traficantes e mesmo assim, lá em Inhaúma, longe do palco preparado.

Bem, o lado bom foi exatamente não ter acontecido um banho de sangue, foi ver todas as forças policiais atuando em conjunto, a população aplaudindo soldados do exercito nas ruas (e 1964???). Foi ver as mulheres e advogados dessa corja de bandidos serem presos e ter os bens tornados indisponíveis. Bom foi ver os moradores dessa região sentindo-se livres, em paz, de certa forma.

Lá no morro, havia maconha, armas, tudo em tonelada. Mas bandidos marrentos... nenhum. Isso mostrou a cara covarde dos traficantes, que são cruéis apenas com civis, mas que nunca tiveram a menor condição de enfrentar o Estado.

O que não muda:

Quem leva armamento pesado para os morros mora longe dali, é rico, alguns têm patentes;

Quem alimenta o tráfico são os usuários, sem eles, não há traficantes;

O Pimentel vai continuar na Rede Globo

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

OS DESABRIGADOS DA UPP





Um dos problemas que mais afligem a população das grandes cidades é a falta de habitação, de moradias dignas. E o que dizer quando moradores são obrigados a deixar suas casas por causa da polícia? Isso, sim, é o fim do mundo.
Agora, devido à instalação das chamadas UPPs -Unidades de Policia Pacificadora-, estamos presenciando um êxodo dos antigos donos dos morros, quer dizer, das comunidades. É triste, tocante, ver homens saindo no meio da madrugada, deixando seus barracos de dois e tres andares personalizados. E olha que alguns têm piscina, sala de jogos e câmaras de tortura de última geração.
Andando sem direção, adolescentes, pós-adolescentes e adultos, olham para o futuro incerto. Nas mãos, carregam seu fuzis, suas pistolas, um saquinho plástico com granadas e grandes sacolôes de drogas. Alguns olham para o céu, certamente lembrando do espetáculo das balas traçantes, aqueles projéteis lindos, riscando o céu da cidade. Ah, que saudade das balas perdidas, aquelas safadinhas que nunca acertavam a pessoa certa.
Olhando para trás é facil perceber a lágrima que escorre de alguns olhos. Principalmente ao lembrar dos bailes funks, dos proibidões, das meninas que apareciam grávidas e não faziam a menor ideia de quem era o pai. Tudo bem, porque eles também não faziam a menor idéia de que tinham filho. Tudo livre, bem natural, sem essas neuroses, esses medos doenças fatais e outras bobeiras exploradas pela mídia neoliberal.
Ao passar pela parte elevada do morro, alguns param e ficam ali, olhando para o microondas. Era tão divertido, pensa um.
E assim, numa fila indiana, eles descem. Já são centenas em todo o estado. Desabrigados, desajustados, sem a menor chance de conseguir outro emprego tão legal. Imagina, um deles ganhava pra soltar pipas quando via a polícia chegar. Agora, a pipa não sobe mais. É duro pensar que nenhum deles vai ganahr promoção por derrubar helicópteros.
O que resta a fazer? talvez alguns arrastões, quem sabe queimar uns onibus... mas, é besteira, nada vai substituir a sensação de ser o rei do morro, de comandar os moradores, sempre tão receptivos, tão obedientes. A adrenalina de atrair as patricinhas da zonal sul, que querem mais é emoção, o perigo, a imagem viril do dono da boca, com suas bazucas.
E a gente pergunta, pra onde vão todos eles?
Tem gente dizendo que a retirada nada mais é do que um acordo de ‘cavalheiros’, em que o poder público se compromete com o poder local a devolver as terras ocupadas depois de 2016, ao fim das Olimpiadas. Até lá, a galera pega mais leve, vai para outros municipios, estados. E todo mundo fica bem na foto.
Parece haver um elemento ficcional nessa ‘teoria da conspiração’, mas basta ver a declaração de atores famosos e produtores internacionais que vêm filmar no Rio, nas comunidades, para se ter a certeza de que tais acordos existem e são praxe, apesar da negativa oficial.
As autoridades constituídas trabalham sempre com a hipótese de de que a população é ingênua, passiva, e vai acreditar nas declarações oficiais. Recentemente alegaram que os arrastões são fatos isolados, sem nenhuma orquestração. E logo depois 19 comandantes de quarteis no Rio foram trocados. A realidade é algo em que voce acredita

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

RESPEITÁVEL PÚBLICO... O SHOW NÃO PODE PARAR!!!

Para quem gosta de eleições, nada como um segundo turno. Aproveitar seu domingo para realizar o ato cívico, degustar cada segundo diante das urnas como quem sorve um néctar dos deuses. Sim, no dia 31 de outubro seremos obrigados, em nossa pretensa democracia, a votar, a escolher quem vai ficar à frente do governo nos proximos quatro anos. A pessoa na qual vamos depositar nossas frustrações e culpar por nossas omissões, por nossa inércia.
Dilma Roussef , com sua inexpressividade, suas chapinhas e sua absoluta falta de carisma, passa a correr riscos. Ela, assim como muita gente, pensava que a simples presença do mais querido presidente brasileiro de todos os tempos agora nesse segundo seria suficiente para ganhar no primeiro turno... não foi.
O fato de ser uma mulher, a primeira com reais chances de chegar lá, não mudou em nada o humor dos eleitores. Quem viu algum debate na tv sabe que Dilma tem dificuldades para convencer até seus eleitores mais elementares, ainda mais quando o assunto é polêmico.
José Serra, por outro lado, é macaco velho. Mas, nesse caso, tão velho que já está passando do ponto. Ele é lento, lerdo e saudosista demais. A qualquer pergunta, sempre citava sua passagem no governo de São Paulo... "Quando eu fui governador de São Paulo...". ou seja, ao invés de olhar para o futuro retumbante, mirava seu passado cheio de poluição da grande metrópole. Sua presença nos debates dava sono. A impressão era a de que ele estava confortavelmente esperando o fim da eleição no primeiro turno para descansar, pescando às margens do Tietê.
Para complicar isso tudo, havia a Marina. Talvez o fato dela ser muito magra e virtualmente invisível de perfil, tenha influenciado os institutos de pesquisas, que erraram feio, mais uma vez, e não detectaram os milhões de votos ambientalistas evangélicos da candidata. Por causa disso, teremos o tal segundo turno. E o pior, não teremos Plínio para alegrar o ambiente.
Enquanto isso, já com seu novo/velho governador, o Rio retoma sua vocação, a de cidade da aventura. A novidade é que os arrastões saíram das areias de Ipanema e invadiram as ruas da cidade. É uma versão upgrade. Pois, se na praia os bandidos usavam bermudas e raramente estavam armados, nas esquinas, eles portam metralhadoras, fuzis e granadas.
A desculpa oficial é a de que as UPPs estão expulsando os meliantes para o asfalto. Se é assim, por que não previram e tomaram atitude? Se previram, então o problema é maior, e a impressão é a de que estão empurrando sujeira para debaixo do tapete.
Nesse ritmo, os mega eventos de 2014 e 2016 passam a ser incógnitas no país da Tropa de elite 2...

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Houve uma vez um Rock in Rio

Parece que foi ontem.. Essa frase é tão batida. Parece que vai ser hoje, sim, é isso. A expectativa é tão importante, e em 1985, rádios, tvs, jornais, todos e tudo chamam a atenção para o maior evento musical que o país já viu, o Rock’n Rio. Para ele foi construída a cidade do rock, afastada do centro, nos recônditos da Barra da Tijuca. Hoje a noite quem abre o evento é o Ney Matogrosso... ué, mas ele não é rockeiro...
E fez-se o som naquele 11 de janeiro.
Pela primeira vez, os grandes pesos pesados da música, no auge da carreira (a maioria), aportavam em nosso planeta: Queen, Iron Maiden, Rod Stewart, YES, Scorpions, etc. Era a realização de um sonho para muita gente. Foram 10 dias inesquecíveis, e desde então a música não parou mais de tocar.
Nem tudo deu certo, claro. O som das bandas internacionais era muuuuito melhor do que o destinado aos nossos herois da resistencia. Erasmo Carlos, que era chamado de Tremendão por causa da jovem guarda e não por causa de Parkinson, quase foi imolado no palco. Apedrejado ele foi. As bandas nacionais, como o Kid Abelha, além de Eduardo Dusek e outros, foram vaiados estrondosamente no primeiro dia em que se apresentaram. Lulu Santos viu e temeu o caminhar da humanidade e pensou em voltar pra casa. Felizmente, essa situação se reverteu durante os dez dias do evento. No fim, os Paralamas do Sucesso, com um show simples e despojado de ideais, apresentou um carinha que sabia falar muito bem, um tal herbert Vianna, que pagou geral para a galerinha que preferia ouvir os gringos. Virou ídolo imediato, e teria ido muito mais longe como porta voz de sua geração, senão tivesse trazido ao Rio aquele garoto esquisito conhecido como Renato Russo, mas isso é outra historia. Até por que a Legiao Urbana não foi convidada para a festa.
O Rock’n Rio passou longe de ser um mega festival de rock, contava com uma infinidade de timbres e personalidades tão antagônicas quanto Billy Idol e (de novo) Erasmo Carlos. Teve Gilberto Gil, Nina Hagen, Pepeu Gomes e James Taylor, além de All Jarreou. Mas isso não tirou o brilho da festa, ao contrário. A perfeição nasce da diversidade.
Em 1991, o palco foi o Maracanã. Teve Prince, Guns’n Roses, New Kids on the Block e ... Serguei. Não deixou saudades, e a cena mais impactante do evento foi uma chuva de pedra, garrafas etc em Lobão, que ainda continuou a cantar. Ele sempre teve tendencias suicidas. E a última vez no Rio foi em 2001. Teve Oasis, N’ Sinc e Britney Spears. Depois disso, o Rock’Rio foi passear em Lisboa, em 2004 e 2006 e 2008 (também em Madri) e 2010. Ou seja, o Rock’n Rio virou portugues. E o mais incrível, o cantor Roberto Leal, de quem o Justin Beeber pegou o visual, não esteve presente em nenhuma edição.
Agora, passando da infancia à fase adulta, o Rock está de volta ao seu local de origem.
Será um mega festival e com certeza vai levar milhares de pessoas à neo rock city. Também é certo que haverá grandes nomes, especula-se Shakira, Lady GA GA e ‘coisas’ do gênero. Mas, o encanto não é o mesmo.
Hoje, o Brasil faz parte do roteiro mundial dos grandes astros da música. Os norte americanos já sabem, mais ou menos, reconhecer o nosso país no mapa, pelo menos quando não o confundem com a Africa. Vamos sediar uma copa do Mundo e as Olimpiadas. Enfim, o Brasil saiu do anonimato. Por isso, o Rock’n Rio, que será o primeiro para muita gente, não terá aquela coisa da magia que envolvia não apenas os shows, mas tudo ao redor.
Cada detalhe daqueles dias trazia a novidade embutida, a curiosidade, a dúvida. Não era fácil chegar à cidade do Rock, e voltar então... rsrsrs. Era a primeira vez para nós e para eles, em todos os sentidos, e isso a gente não esquece. Até o nome do evento tinha a ver com o momento, com a explosão mundial do rock, que era uma verdadeira febre nacional. Caetano e Gil se diziam rockeiros de ocasião. Gil, inclusive gravou o punk da periferia, que soava falso na pseudoverboneural linguagem do baiano. Mas era normal, todos queriam tirar casquinha do rock, daí o nome do evento. Se fosse realizado alguns anos depois, seria chamado Lambada’n Rio, nos anos 90 seria Sertanejo’n Rio e depois É O Tcham’n Rio. Por isso, devemos agradecer por aquele momento em 1985.

terça-feira, 20 de julho de 2010

O NADA é ETERNO




A vida, tão cheia de sofrimentos, angustias, resignações e perdas. O nascimento é o primeiro passo para o fim, a sentença de morte. A partir daquele dia o que há é uma contagem regressiva, uma trilha que pode ser longa ou extremamente curta. Para piorar o cenário, pode ser interrompida a qualquer instante.
Voce pode ter uma infancia feliz, mas vai chorar e se frustrar demais. Será levado para lugares onde não quer ir, encontrará amigos e logo terá que deixá-los para trás, ou será deixado por eles. Adultos vão gritar, berrar com voce e talvez até lhe bater. Dirão que essas experiencias são necessárias para seu crescimento. Dirão mentiras para se justificarem. E você vai repetí-las.
Depois, seus hormônios vão explodir e você vai se apaixonar por alguem que não vai lhe corresponder. Aí, voce vai pensar que o mundo vai acabar por causa disso. Logo depois perceberá que nada acabou ao redor, mas a sensação vai se repetir várias vezes. Ou então, você se dará muito bem, será a sensação e vai perder a noção do que realmente deveria importar em um relacionamento.
Bem, você vai ouvir falar do bem e do mal. De pessoas boas e más. E vai descobrir que isso é pura bobagem. Quem sabe voce passa a acreditar em alguma religião. Isso é bom, porque a vida terá o sentido que seu pastor, papa etc disser para voce. É bom, é cômodo. Se está ‘escrito’ então é verdade. Não importa quem escreveu nem que o livro seja repleto de coisas que você nunca vai entender. Isso também é ruim, porque você não terá escolhas a fazer.
Após um período em que você vai acreditar em tudo, passará a duvidar de tudo. Vai contestar seus pais, vai querer salvar o mundo ou modificá-lo... mas não saberá em que isso vai mudar as coisas na sua vida. Pior, vai saber que muita gente pensa da mesma forma. Cada um pensando em seu próprio mundo. E vai descobrir que só com muuuuito dinheiro você muda alguma coisa. Mesmo assim, só na aparencia.
Vai ter decepções com amigos, parentes e amores. Vai trabalhar, ter a profissão que escolheu, e descobrir que é feliz... mas que isso é como uma droga, dura alguns segundos apenas.
Vai casar, ter filho, brigar com a mulher, com os filhos. Vai querer outro amor e descobrir que o amor também é simplesmente uma fuga.
Vai sofrer ao olhar para tras (por nostalgia ou pelas chances que perdeu) e para o futuro, que nunca será igual ao que você imaginou.
Verá seus amigos e parentes morrerem e por mais que queira se enganar, em alguns momentos terá a exata noção de que anda numa ponte sobre um abismo, e que a ponte termina em algum lugar, logo ali. Mas, você raramente terá a oportunidade de saber onde é ‘ali’.
E assim, no fim, se envelhecer, ficará doente, indefeso, dependendo de outras pessoas, que você nem lembrará quem são. Seu corpo, tão decantado, será uma máquina velha, cheia de defeitos. Morrerá com suas idéias e seus sonhos (se os realizou, se não, não importará. Não será mais que uma sensação breve) e deixará para outros a explicação do por que voce teve que ir. Ir.. pra onde?

sexta-feira, 9 de julho de 2010

UM




Um dos temas que está presente todos os dias em qualquer parte do mundo é Deus. As definições que lhe dão são tão simplórias quanto incompreensíveis, dentro do que pode haver de explicação a nivel humano. Aliás, a limitação humana pode ser a chave do problema.
No início, a natureza era Deus. Havia uma coerencia ao se observar o sol, a lua, as estrelas, a chuva, uma manha de primavera. Aí, quando se percebeu que o fogo causava mais estragos que seus concorrentes, passou-se a ter uma certa convicção de que Deus era o fogo. O fogo criador, o fogo inextingível, o fogo que destrói o inimigo, e por aí vai. A violência norteou essa definição e até hoje inlfuencia o planeta.
O problema é que não ter a forma humana causava um certo incômodo. Aí, surgiram as primeiras tradições orais, depois escritas e agora digitadas. Quem escreveu a Bíblia (E FOI UM HUMANO!) decidiu que Deus nos fez à sua imagem e semelhança. Uma idéia que demonstra toda a arrogancia de nossa espécie, pois essa comparação de alguma maneira nos favorece e complica Deus. Além disso, Ele, supostamente, escolheu um povo, contrariando assim a máxima de que Deus não faz distinção entre pessoas.

Seria Ele um negro? Seria branco de olhos azuis? moreno e forte? velho? novo? barbudo? e que diferença isso faria, afinal?

Deus, esse enigma que permeia nossa existência, parece um abismo, tão profundo que dormimos ao cair e temos sonhos sobre o que há lá dentro. Deus É! Ponto.

A evolução só nos trouxe novos problemas, e a questão divina não ficou fora disso. Coloque numa sala um palestino, um israelense, um muçulmano e um inglês e pergunte como é o Deus de cada um. As respostas, provavelmente, terão em comum o fato de Deus ser justo. Deus é justiça. Mas, esse conceito, assim como ‘n' outros, é relativo. É justo que o povo palestino não tenha direito às terras que reinvindicam? É justo que o Irã não possa ter armas nucleares enquanto os EUA podem destruir isso aqui quantas vezes quiserem? É justo que você chegue na padaria cheio de vontade e o padeiro lhe diga que o sonho acabou? Tsc tsc
Por não conseguirmos lidar como as barreiras do dia a dia precisamos de uma zona de conforto, que podemos chamar de Deus. Nele depositamos nossas esperanças, nossos sonhos e nosso marasmo. Esperamos que Ele resolva nossos problemas e sempre apelamos em casos mais difíceis.
O fato é que cada um de nós tem seu Deus, pois Ele é fruto do que aprendemos na vida e das percepções que advem daí. Podemos pensar que Ele é o mesmo para todas as pessoas, desde que não paremos para trocar idéias. Afinal, em qualquer guerra, Deus é chamado para defender esse ou aquele país ao mesmo tempo. Isso prova que existe acepção de pessoas, visto que num confronto muitos morrerão? Mas... com certeza dirão que Deus estava do lado de quem venceu. Pior do que isso é ouvir máximas como: "a voz do povo é a voz de Deus", claro que não é, pois como todo mundo sabe, a voz do povo é a voz da Globo.
Tem um pagode que sugere a possibilidade de Deus estar de saco cheio, porque tudo que acontece por aqui, a gente coloca Ele no meio. Existe sabedoria nesses versos simples.

Fico me perguntando se Deus consegue sentir. Se Ele não nasceu, não cresceu, vive sozinho, nunca teve pais ou irmãos ou amigos, como pode entender as súplicas que lhe são feitas? Deus é Amor, mas, o que é o amor, de que é feito? Medimos o amor e Deus pelos nossos umbigos.

terça-feira, 6 de julho de 2010

DIGA-ME QUEM ESCALAS QUE TE DIREI QUEM ÉS





COPA DO MUNDO, ah, que saudade! E olha que ainda não acabou, a final é no domingo e hoje ainda é terça-feira, antes da primeira semifinal, entre o improvável Uruguai e a dedicada Holanda, que nos eliminou. Aliás, eliminou o Dunga.
Diferente das outras copas, pouca gente foi de livre e espontânea vontade às ruas, e se não houvesse uma competição patrocinada pela Globo, seria ainda pior. Bem, talvez essa apatia fosse o reflexo perfeito da seleção brasileira. Apesar da união alardeada, do perfeito entrosamento decantado e da disciplina tática por tras dos portões fechados, pouca gente acreditava de fato que seriamos compeões. E quem achava isso tinha que ser avaliado, certamente havia teor alcoolico acima dos niveis normais no organismo. Ou pior, talvez fossem casos de uma doença slogânica chamada: "Sou brasileiro, não desisto nunca!". Algum engraçadinho da publicidade inventou isso e a tv se incumbiu de colocar nos cérebros de milhoes de brasileiros. Parreira tinha razão quando disse que o povo é uma caixa de ressonância.
Como todo ‘bom’ treinador, Dunga tinha suas preferências, suas idiossincrasias e suas maluquices. Ele é um homem obstinado com um sonho: todo grupo tem que parecer um exército numa guerra. E por isso, ele fez Robinho pagar 500 flexões por sorriso que escapasse em alguma entrevista. Deu certo. No último jogo, o garoto das pedaladas virou um monstro e quase engoliu, literalmente, um adversário holandês. Quem tem tv high fulll definition plus master consegiu sentir até o bafo.
Kaká era o centro das atenções da mídia, principalmente do Galvão Bueno, que é uma mídia e resolveu achar que o camisa 10 era muito mais do que um dia foi. Sem contar com o fato de que o atleta estava mal fisicamente, apesar dos desmentidos do médico Runco (repararam como esse médico parece estar sempre bêbado ou com sono?). O mesmo médico que garantiu que Julio Cesar estava perfeito, até que no segundo jogo ele caiu e todo mundo pôde ver que havia uma armadura por baixo da camisa. Claro, era mesmo uma guerra.
Mentiras sinceras, dirão, afinal, se soubéssemos o que já sabíamos mas fingíamos que não percebíamos, seria mais fácil imaginar uma desclassificação antecipada. E como ia ficar o feriado em dia de jogo?
A máxima de todo treinador sensato é: "Vou chamar quem estiver bem no momento!". Tudo bem, concordo... mas por que o sósia do Arnold Sharzenegger chamou o Luis Fabiano? E por que o Galvão Bueno acha que ele é fabuloso? O cara não fazia gol há uns 9 meses. Na Copa, marcou contra Costa do Marfin e o Chile, mas nos jogos de verdade, contra seleçoes completas, Portugal e Holanda, ele não apareceu em campo.
Julio Cesar foi mais um ator de filme patriótico do que jogador, e suas lágrimas, que demoraram a sair, pareciam constar de um script pronto. Nada contra o goleiro, que é mesmo um dos melhores do mundo, mas essa lenga lenga toda não nos levou a nada. E mais, se era um mata-mata, era melhor levar o Bruno.
Agora, falar da seleção e não falar de Felipe Melo, é ligar a tv num domingo e não ver o Silvio Santos. O que foi aquilo? QUEM DISSE QUE ESSE FELIPE MELO é jogador de seleção? Um atleta que tem como hobby colecionar cartões amarelos e vermelhos não é uma opção. Pois bem, esse rapaz consegiu entrar para a história como o grande vilão de 2010, aquele que será sempre lembrado como... como muita coisa impublicável. Qual o prazer que ele sentiu ao pisar no velho holandes, Robben? E quando quase decaptou um jogador de Portugal? E quando resolveu brincar de estátua e não marcou o jogador da Holanda que estava ao seu lado e calmamente se posicionou para marcar o gol da vitória? Não, Felipe Melo virou um fantasma, alguem que vai nos apavorar por muito tempo.
Assim, essa foi a Copa do Maradona, do técnico melequento da Alemanha e sua jovem seleção de ótimos jogadores... e do Dunga, que perdeu a guerra dos seus sonhos.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

MARADONA CONTRA O RESTO DO MUNDO



Estava em casa, em frente à tv. Lá, nos recônditos selvagens da Africa, começou a Copa do Mundo. E cada uma é diferente da anterior, não apenas porque o cenário é outro, mas em virtude dos avanços tecnológicos e mudanças provocadas por questões sociais.
Novas câmeras fazem os jogos parecerem videogames, cada gol pode ser observado de vários ângulos e em breve teremos a visão da bola, com uma micro câmera instalada na esfera. E falando em realismo, quem já tem tv LCD em 3D de 42’ vai pensar que está dentro do campo. É o máximo. O proximo passo deve ser a holografia.
Os juizes usam head sets e as bandeirinhas possuem sensores que avisam ao árbitro de alguma irregularidade observada pelo auxiliar. Os estádios construídos e reformados são maravilhosos, ultra modernos. Tem um que possui grama sintética, aprovada pela primeira vez para uma copa do mundo.
Em contrapartida, o futebol, que deveria ser o motivo principal do espetáculo, vai mal das pernas. Além de empates e vitórias magras, o que se viu nessa primeira semana de copa foi a constatação de que houve uma guerra e a Europa venceu. É lógico, no fim das contas, pois os principais jogadores dos paises participantes jogam em clubes no velho mundo, e ao que tudo indica, ao invés de influenciarem uma mudança no modo de jogar, foram influenciados. O resultado é que os países africanos, os asiáticos e a America do Sul mostraram um futebol previsível, burocrático, asséptico e que desperta apenas o sono. Os primeiros jogos foram excelentes para quem sofre de insônia.
Essa globalização da bola foi traduzida em vitoria do Japão contra Camaroes, Coréia do Sul vencendo a Grecia, que derrotou depois a Nigeria. Vimos também a Suiça, país em que o principal esporte é o campeonato de fabricantes de chocolates, vencendo a Espanha, apontada como a grande favorita. Na verdade, apesar de alguns comentários contrários, não acredito que houve zebra alguma até agora, porque nessa homogeinização a mediocridade é geral. Para os africanos, acabou a alegria, o futebol arte, restou a vuvuzela, um artefato mistico tribal, uma espécie de trombeta do apocalipse capaz de deixar surdo quem toca e quem ouve ao mesmo tempo.
Até a velha rivalidade entre os países arrefeceu, afinal, os jogadores de Alemanha, Chile, Camaroes e EUA são amigos, jogam juntos em clubes. E mais, a seleção da Alemanha tem 8 ‘estrangeiros’. Essa onda de naturalização oportunista destrói o velho apelo da competição, que era uma disputa entre nações, uma ‘guerra’ esportiva. Hitler, lá embaixo, deve estar ardendo de raiva e ódio ao ver um jogador negro, Cacau, fazer gols e virar estrela naquele país que seria o símbolo da supremacia loira, alta e de olhos azuis.
Mas nem tudo está perdido, ainda. Maradona, gostem ou não, é a figura da Copa, e sua seleção, um exemplo de que o futebol deve ser diferente, manter características essenciais e ter pelo menos um craque para servir de referencia. Los hermanos em 2010 continuam cabeludos, arrogantes, velozes e com fome de gols.
Antes, ao vermos uma seleção brasileira, exigíamos que ela fosse parecida com a perfeita de 1970 ou a artística de 1982, agora, ao observarmos o técnico Dunga chamando o Escobar (reporter da Globo) de careca pra baixo, o capitão Lucio e a armação tática, ficaríamos satisfeitos se o elenco tivesse um pouco da determinação ofensiva da Argentina. Alguns dirão que o importante é ganhar, mas sou daqueles que acham que não basta ser campeão, tem que parecer campeão.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

A SOMBRA E O ESPELHO



Sempre achei que as pessoas valorizavam demais minhas crônicas, mas nunca reclamei disso, afinal de contas, essa admiração passou a se transformar em dinheiro, fama, etc. Tudo bem, isso não traz felicidade, mas serve para comprar um monte de coisa.
Bem, o fato é que a minha exposição em um número cada vez maior de impressos e na internet propiciou uma vida que inclui visitas a diversos países, conhecer pessoas incríveis, boas mulheres e mulheres boas.
Outro dia, estava autografando meu trabalho mais recente, um livro de crônicas sobre as impossibilidades do poder. Uma análise pretensamente divertida sobre ditadores latino americanos e torneiros mecânicos. Sucesso de crítica e público, fico até com vergonha, às vezes. Mas, lá estava eu, tirando fotos com pessoas sorridentes, algumas nunca tinham lido nada meu, estava nos olhos. Tapinhas nas costas, uma senhora apertou minhas bochechas, um garoto puxou a mãe dizendo que aquela fila era muito grande e chata e boba, uma garota veio com livro de poesia para eu dar meu aval.... tudo previsível. Aí, tive a brilhante idéia de fazer uma pesquisa no boca a boca, para descobrir qual a crônica de que mais gostavam. Naturalmente, pelas vendas, seriam diversas, de épocas diferentes. Entretanto, algo estranho aconteceu. Fiz a pergunta a mais de cinquenta pessoas que me pediam para autografar o livro. Para minha surpresa, cerca de 90% disseram que adoravam a mesma crônica: "A revelação".
Vocês podem imaginar como um autor fica satisfeito ao perceber que fez uma obra-prima. E olha que os adjetivos eram de ‘sensacional’ para cima. Uma senhora chegou a dizer que preferia inclusive ler a versão em francês. Não havia dúvida, ‘A Revelação’ era um sucesso absoluto. E o melhor é que até adolescentes que estavam na livraria também citaram a crônica como a melhor coisa que leram. Dupla felicidade, adolescentes que leêm... e gostam de mim. Mas, pera aí, pensei. Não sei quantos elogios depois, me toquei de que eu nunca escrevi uma crônica chamada ‘A Revelação’, e nunca estive na França.
Podemos explicar Hugo Chavez e até como a China consegue crescer enquanto o resto do mundo mergulha numa crise econômica sem precedentes, mas algo desse tipo, não. Entrei no google e descobri que ‘minha’ crônica era um sucesso mundial, citada em inúmeros sites e serviu de base para teses e debates acadêmicos. A cada toque no teclado a coisa ficava mais estranha. ‘A Revelação’ era uma das crônicas de uma coletânea chamada SINAIS. E nos sites havia minha foto.
Eu já havia escrito sobre esses seres que preferem viver à sombra de outros a ousar e expor seus trabalhos. Bem, agora eu também era vítima dessa popularidade involuntária, e o pior é que o texto tinha mesmo algo de mim. Eu poderia ter escrito algo assim, mas... não escrevi.
Entrei em contato com minha assessoria e descobri que o tal livro estava esgotado. O departamento jurídico de minha editora começou a se movimentar, afinal, eu era exclusivo, e a coletânea saiu por uma tal de Infinitus. Aquilo se tornaria um caso de polícia, com certeza. Passara da homenagem à falsidade ideológica. O irônico era saber, através de uma pesquisa encomendada, que grande parte do meu sucesso vinha dessa farsa. As pessoas liam SINAIS e corriam atrás de outros trabalhos. Um crítico disse que sem essa coletânea, por causa especificamente de ‘A Revelação’, minha carreira talvez nem tivesse existido.
Aquela história começou a me incomodar e tirar noites de sono. Tornara-se uma questão de honra descobrir o surrupiador, o esperto, o cara que sabe copiar. No entanto, de uma maneira canhestra eu devia a esse homem (podia ser uma mulher) minha fama. Era incômodo pensar por que essa figura se mantinha oculta. Ele ganhara muito dinheiro às minhas custas com aquele livro. Por que não se lançou no mercado editorial? Claro que ele sabia do sucesso. Ou não? E... se fosse um psicopata?
Bem, o que começou com um aparente engano ganhou proporções quase cinematográficas. A cada descoberta o mistério aumentava. Não havia registro da tal editora. As lojas que comercializaram o livro simplesmente não tinham registro da obra em lugar algum, mas funcionários lembravam perfeitamente de ter visto o livro nas prateleiras. A gerente de uma megastore na zona sul verificou, inclusive, da tarde de autógrafo que aconteceu há cerca de cinco anos. Isso era um absurdo total. O impostor esteve lá, se passou por mim. Ela entrou nos arquivos de eventos. Havia algumas fotos, mas tiradas no meio de um tumulto. Nossa, eu, quer dizer, ele, chamou muito a atenção. Dava pra me ver, vê-lo, de relance apenas. A gerente riu e perguntou se eu não lembrava daquele dia. Eu disse que era impossível esquecer (se tivesse acontecido, claro).
Bem, depois que um neoliberal sumiu com o metalurgico Lula e assumiu suas feições, tornando-se presidente da república, pensei, tô ferrado! Claro, era só uma questão de tempo até que o homem viesse atrás de mim. Ele parecia comigo, escrevia no meu estilo, e... era melhor do que eu. Pensei também que talvez eu devesse encontrá-lo antes e acabar com ele, afinal, tudo que eu era se devia a um engano monstruoso. Ele, e não eu, escreveu as melhores crônicas.
Passei a ficar preocupado, muito preocupado. Era uma questão de honra descobrir o farsante. Mas, no mesmo momento, pensei que se o caso fosse revelado, metade, ou mais, da minha fama iria para o brejo, onde quer que ficasse o brejo. Eu poderia falar com meus amigos, com o Vasconcelos, por exemplo, mas, não, eu poderia perder meus amigos também, pois a maior parte dos atuais, só veio depois da publicação da ‘Revelação’.
De repente, percebi que estava em um beco sem saída, e nesses casos você não tem escolha, tem que agir. Se o fulano resolvesse confessar que havia escrito a cronica tudo estaria terminado, para mim. Seria execrado pela mídia, apareceria em programas sensacionalistas e estaria a um passo do precipício chamado ostracismo. Dizem que quem cai nele jamais volta. Eu não deixaria isso acontecer.
As semanas passaram lentas, até que um belo dia ouvi um anúncio na tv dizendo que eu, ele, estaria no programa Você é o Show. Eu não acreditei. Ele perdera a noção completamente. Como poderia aparecer assim, em público? De qualquer forma, era a chance, isso era o que importava.
Disfarçado, usando um bigode postiço, cabelos pintados e um chapéu panamá, consegui entrar no auditório do programa. Estava lotado. O apresentador chegou rindo, como sempre, rodos eles riem. Fui obrigado a assistir uma infernidade de pseudo atrações. Uma brincadeira com macacos e mulheres vestidas de banana; um anão que nunca se afoga. Se bem que essa foi por pouco. A vida de um artista famoso de quem ninguem se lembrava e uma dança nova, que vai ser o sucesso do proximo carnaval. Era a mesma que eu vi há 15 anos atrás, na Bahia. E, finalmente, chegara a hora.
Meus amigos, temos o prazer de receber em nosso programa o sensacional escritor, e autor de uma das croncias mais aclamadas de todos os tempos, Érico Justissimo. Ele vai nos falar de seu novo livro, Te encontrei, cheio de mistério e humor. Palmas, auditório!
É um prazer estar aqui.
Durante os 40 minutos de entrevista minha vontade foi a de levantar e acusar o impostor. Mas, não. Era isso que ele queria, por isso se expôs. Não tinha medo de mim, pelo contrario. Dali em diante iria se expor para me provocar ao máximo. Imediatamente, veio à cabeça minha cobertura na Barra da Tijuca e o apartamento do Jardim Botanico. NÃO! Gritei interiomente. Tudo acabaria hoje.
Esperei o apresentador se despedir e saí. Eu conhecia bem aquelas instalações, já estivera em programas ali. Tirei o meu disfarce para facilitar o acesso. O impostor usava uma roupa muito parecida com a minha. Camisa azul celeste e calça cinza com meia amarela. Ele copiou tudo. Só as meias eram mais amarelas.
Desci as escadas e esbarrei com o apresentador, Fofão. Ele disse que adorou minhas respostas. Se ele soubesse. Só depois de 10 minutos consegui me desvencilhar. Corri feito um louco e ao chegar ao camarim... estava vazio. A camareira me olhou e perguntou se havia esquecido algo. Eu saí correndo em direção ao estacionamento, no terraço. Lá estava ele, sozinho, entrando no carro. Meu Deus, até o carro era uma cópia do meu.


- Fique aí, mesmo!!! – gritei, com toda a força de meus pulmões! – aos poucos, ele foi virando.
- Nossa, estava demorando. Por alguns segundos achei que não viria. – deu um sorrisinho enigmático.
- Hã? o que quer dizer, impostor? – eu não estava armado, mas ele não sairia dali com vida.
- Quero dizer que você se saiu bem. Consegiu.
- Você é louco! Ganha a vida com meu trabalho, meu nome.
- Hahahahahahahahahaha
- Pare de rir. Caso você não tenha percebido, esse mundo é, sem dúvida alguma, muito pequeno para nós dois. – Caramba, ele era uma cópia perfeita, não apenas parecido comigo.
- Tá, desculpa, desculpa. Não vou mais rir. – ele encostou no carro e abriu sua pasta cheia de papéis. Eram crônicas, reconheci o estilo da escrita manual, que também era idêntica a minha.
- O ... o que é isso?
- Calma, deixa eu ver. Hum... – ele pegou uma das folhas, olhou de cima a baixo. – não sei...
- NÃO SABE O QUÊ?
- Bem... pode ser assim. – pegou uma caneta e começou a rabiscar algo. Escreveu umas tres folhas – abriu um sorriso que quase me enganou. Então, meteu a mão na porta do carro e a abriu. – bem, vamos terminar isso.
- O quê??? – ele tinha uma arma, era isso! Eu tinha que agir depressa. Pulei em cima dele, que tentou se defender. Era como bater em mim mesmo. Ele foi cambaleando e tropeçou em um cano de ferro.
- NÃO!!! – gritei, pois sabia o que ia acontecer em seguida, não tinha como ele segurar em nada. E caiu.
Eu peguei a pasta e os escritos que estavam no banco traseiro do carro e fuji correndo. Estava acabado. Ninguém iria suspeitar de nada.
Já em casa, tomei um banho. Pensei em tudo que havia acontecido, no que a vida havia se tornado em tão pouco tempo. E o público não sabia de nada. Como seria a partir de agora? Liguei a tv e... nada. Bem, eles não iriam noticiar o caso tão depressa. Eu tinha é que pensar em uma estratégia, afinal, encontrariam uma espécie de sósia. Há há há seria até engraçado escrever sobre isso. Olhei a noite lá fora, toda estrelada, quente. Pensei ‘a vida é boa!’. Liguei o som e deixei uma música antiga da Cindy Lauper invadir o ambiente. E assim, pensei que eu acabaria dormindo, deixando os problemas para o dia seguinte. Foi aí que passei o olho na sala, e na mesa estavam minha pasta e também os papéis do falso escritor. Talentoso, sem dúvida. Fiquei curioso, será que entre os papéis existiria outro ‘A Revelação’? levantei e comecei a mexer. Havia contos e cronicas antigas, trabalhos meus. Coisas que eu não havia publicado. E ... um papel meio amassado. Sim, era isso que ele estava escrevendo pouco antes de cair.
‘ ... eu não sabia como terminar a história. A presença dele era incomoda demais. Só que nesse exato momento, ele me olha, ameaçador. Vai me atacar, vai pensar que vou pegar uma arma ou algo assim. Vamos lutar e eu vou cair. A criatura mata o criador, no fim das contas. Ele vai achar estranho, entretanto, o fato de ninguem comentar o incidente. Não haverá corpo para ser achado....
Lendo aqueilo, comecei a suar, mas continuei.
‘Ele vai suar muito e perceber que existe algo além do que esperava. O som de um trovão o assustará e..."’ Há, não teve nenhum.. VRUUUUUUUUUUUUUUUUUM Ai meu Deus, que é isso? Vou fechar essa janela. Deixa ver onde eu parei... aqui ‘irá até a janela para trancá-la e lá vai perceber um vulto atravessando a rua’. Não é possível, como isso está acontecendo? Quem é aquele maluco atravessando a rua nessa chuva? Não, nada disso está acontecendo de verdade. É um sonho. Sim, é isso, um sonho. Eu vou acordar, eu vou acordar, agora!!! Caramba, ainda estou aqui. E aquele cara lá embaixo, com aquela roupa. É o impostor de novo, ele não morreu. Mas, como? É impossível, eu sei que é impossível! Essas coisas não acontecem na vida real. Eu tenho que sair daqui, ele vai se vingar. Droga, por que não consigo parar de ler essa porcaria? ‘... ele não vai obter resposta, a não ser o som de sua própria voz ecoando. Tentará sair pela porta...’ sim, é claro, eu tenho que sair. A chave. Aqui. Pronto, agora é só virar a maçaneta.. ei, que barulho é esse? Deve estar escrito no texto. ‘Um raio riscou o céu naquele instante, depois veio o trovão, depois os passos encharcados, que agora estavam quase à porta. Ele vai se desesperar e correrá até a cozinha para pegar...’ UMA FACA! Eu tenho que me defender desse louco. Como ele consegue fazer isso? Muito bem, agora é só abrir a prota e...Mas...mas... não tem ninguém aqui. Estou ficando louco, deve ser isso. Meu Deus, por quê? Bem, acabou. Eu estou aqui, esse impostor nunca vai pegar meu lugar. Deve ser o estresse, claro que é. Vamos ver como ele termina esse texto insano. "Sentado no sofá, ele pegou não havia ninguem lá embaixo, eu estava me deixando levar por esse monte de besteira que ele escreveu. Vamos ver como esse palhaço termina a história. ‘... pegou as páginas soltas e as leu. Só então percebeu que nunca passou de um personagem criado por mim. Seu mundo começou a desaparecer lentamente ao redor. As paredes, a tv, os móveis. Ele voltará ao limbo, de onde sairá sempre que alguem ler essa cronica".