quinta-feira, 30 de outubro de 2008

ASSIM É... SE EU PAREÇO


É melhor deixar que de nós falem os outros. Digam eles o que vai em seus corações, que nos vejam como espelhos e reproduzam seus defeitos e virtudes de uma maneira desvairada. Que falem tudo que os atemoriza, que os envergonha, que vejam em nós algo que reconhecem de algum lugar, ainda que lhes pareça inédito ou louco. Que os outros vejam em nós o que mais lhes incomoda, algo que por estar dentro deles não se permitem conhecer.


Deixe que falem de amor e amizade, de sentimentos nobres, caros, raros, e que somos importantes em suas vidas, em algum segundo de algum momento que chega e passa. Deixa aos outros a tarefa de definir e rotular, a nós cabe o sorriso infantil, por não nos vermos nesses personagens, por sermos todos... na mesma intensidade de jamais ter sido algum.


Se eu fosse, seria então quem voce nunca viu, quem voce nunca entendeu, quem voce mais amou mesmo sem saber por quê. Quem andou com você numa praia distante e viu um sol se por, dando lugar às estrelas que incendiaram a noite e afugentaram a solidão.


Mas não... eu não sou, apenas pareço.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

O ESTUPENDO






Estava decidido: Ademar entraria no mundo do espetáculo. A carreira de arquiteto não deu certo, e não foi porque a casa caiu, isso podia acontecer com qualquer um. Na hora de pagar, todos gostaram do isopor, pensava. Depois disso, resolveu inovar e decidiu criar o projeto do Aviãozinho Zuuuum. Um brinquedo que girava velozmente, preso a uma haste. Um dia a haste quebrou. Sejamos francos, Ademar não teve culpa daquele senhor de 90 anos ter inaugurado a atração. E a polícia, a bem da verdade, até hoje não confirmou se o cidadão morreu por causa do vôo ou porque o aviãozinho se espatifou na montanha russa.

Queria ser famoso, tinha que fazer algo impactante. Depois de estudar a vida e as peripécias de Holdini, Ademar, o Estupendo, como passou a se chamar, viu que atuar nas ruas seria suficiente para ganhar adeptos.

Virou escapista, mestre em fugas impossíveis. Com a ajuda de Guilherme, um sobrinho recém chegado do Amazonas, foi para o Largo da Carioca, no Rio de Janeiro, e anunciou seu número. Acorrentado pelo partner (com força excessiva), fingiu que nada sentia. Isso, até o momento em que Gui colocou o saco plástico em sua cabeça e apertou o barbante. O Estupendo só conseguia emitir sons guturais, o público ria e achava que fazia parte do espetáculo. Gui, forte como um touro, pegou o tio, que esperneava, e lançou-o dentro do tanque.

A idéia era que o Estupendo escapasse em um minuto. Sem conseguir respirar direito, Ademar procurou se concentrar em pegar a chave das algemas no fundo do tanque. Deveria estar lá, mas Gui não foi avisado que tudo era um truque. Pegou a chave e guardou. A platéia estava hipnotizada. Aquela figura se debatendo como louco e jogando o corpo contra as paredes de vidro era uma imagem chocante.

Guilherme tentou ajudar e fez todo o possível para segurar o tanque. Só parou quando notou a coloração azulada do tio, e alguém informou que já se passara mais de dez minutos. Ademar ficou um mês se recuperando, mas escapou.
O Estupendo mudou de estilo, malhou o corpo, tomou anabolizantes e se transformou numa espécie de Silvester Stalonge. Fez contatos com a imprensa. Naquele domingo, várias equipes de reportagem estavam no terreno que Ademar alugou. Nas entrevistas, mostrou segurança e sorriu para as câmeras com naturalidade comum as grandes estrelas. Sabia que a partir dali a vida seria diferente. O intrépido aventureiro do impossível foi acorrentado a dois caminhões. A expectativa era a de que ele conseguisse puxar os dios veículos, aproximando-os. Ademar olhou para os lados, para frente, para a cãmera. Após a concentração, começou a forçar as correntes com o máximo de força possível. por alguma razão, incompreensível para ele, os caminhões não se moviam... nem um centímetro. Ele riu, desconcertado, suando em bicas. As vaias não demoraram muito, e as gargalhadas tornavam tudo ainda mais patético.
Guilherme não queria errar de novo, mas, ao ver o tio a ponto de ser linchado, não teve dúvidas: correu em direção a um dos caminhões e entrou. Ademar já estava sentindo o cansaço, então olhou para um dos veículos e, estarrecido, viu o sobrinho fazendo um sinal de OK. Tentou gritar, mas havia muito barulho. Gui não teve dúvidas: ligou o motor, engatou, sem querer, a marcha-ré, e pisou fundo.
Ademar se tornou uma atração internacional, apareceu até na CNN. Era a primeira vez que a TV mostrava uma tragédia com tantos detalhes.

PARANÓIAS DE NOVA YORK EM 2025 - I




- Cadê a máscara?

- Tá na segunda gaveta da cômoda.

- E o colete? Por que você não deixa tudo à mão?

- O que você chama de "à mão"? estava tudo espalhado. O colete estava em cima do oxigenador de ambiente e a capa antiradiativa quase explode a máquina de lavar.

- Tá bom, tá bom. Desculpa. Droga, cadê a bota, querida?

- Ih, eu esqueci lá na varanda.

- Francamente, linda, da última vez tive que colocá-las por 2 horas no box de descontaminação.

– Ele vai até à varanda – Ihh, já era, desintegrou.

- Desculpa. Mas também, eu tenho que fazer tudo.

- Cadê a empregada que você contratou?

- A Maria? Ela explodiu na casa do Joseph. Mas acho que foi suicídio.

- Que suicídio o quê, era uma missão, eu sempre disse que ela era mulher-bomba.Tudo bem, deixa pra lá. Você sabe onde está aquele par de mocassim com sola de mercúrio.

- Debaixo da cama.

- Ah, achei.

- Querido, é melhor você se apressar, as crianças saem daqui a dez minutos.

- Eu sei, eu sei!. Qual é a rota de fuga que a professora vai usar hoje?
A 23b.

- De novo? Mas não foi essa ontem?

-Não, foi a 21c.

-Humm, deixa eu ver... essa de hoje é a que fica no subterrâneo do McDonalds?
- Isso.
- AHHHHHHHHHHHHH, SOCORRRO QUERIDA!!!!- Ela corre e encontra o marido olhando apavorado para a mão direita. Ele gesticula, dá voltas em torno da mesa da copa e segura a mão coberta pelo pó branco como se não fizesse mais parte de seu corpo. - Afaste-se querida, afaste-se! É antraz, eu vou morrer! arrrrghhhhhh(lágrimas)
- Dá ‘pra’ parar com o escândalo. Isso é sal. É que deixei cair um pouco enquanto temperava o peixe.- O homem tenta se recompor do vexame. Ajeita seu macacão de 30kgs e dá um sorriso amarelado.

- He, he, he, acho que estou meio estressado. Bem, já estou pronto.- Dá um beijo na mulher e, depois de ficar cinco minutos na ante-sala de descontaminação, sai.

- Cuidado com as minas na 42th, o Harry perdeu um braço lá, ontem.

O homem, já na rua, responde:

- Não esquenta, querida. Eu conheço todos os explosivos dessa ru...BUMMM!!!!!