sexta-feira, 26 de junho de 2009

ESPERANDO MICHAEL




Michael Jackson morreu...
Essa frase foi provavelmente a mais dita e ouvida no mundo inteiro nesse 26 de junho de 2009. Ainda assim, não parece fazer muito sentido. Ora, Michael não era eterno?
A impressão que temos nesses dias é que algo está terrivelmente errado com o mundo, e não se trata do aquecimento global, nem das eleições no Irã, tampouco da Susan Boyle ter perdido a final de Idols para um grupo de dança bonitinho, mas ordinário.
A música de Jackson está tocando em todas as rádios, sem contar os especiais que são anunciados a cada 10 minutos. Todas as TVs estão colocando chamadas para programas exclusivos (ainda que usem as mesmas – e super batidas - imagens). A impressão que se tem ao andar nas ruas do centro do Rio é a de que estamos em algum filme que tem a trilha sonora do popstar. Porque os camelôs, lojas, lanchonetes e prédios comerciais, também tocam o astro sem parar. Resultado: Michael está em inúmeros lugares ao mesmo tempo.
Ele deixou de ser uma pessoa para se tornar um vírus que vai atingir milhões de pessoas no mundo e render zilhões de euros. Se era um produto esquisito, mas que ainda vendia bem, agora é uma fábrica de fazer dinheiro.
Obviamente, as teorias sobre o que aconteceu começam a pipocar: Michael não morreu. Ele pegou o dinheiro dos shows agendados e vendidos para viajar e assumir o romance secreto com Elvis, que, claro, não morreu também; Michael não morreu, porque na verdade nunca existiu, era apenas parte de um projeto criado para enlouquecer as pessoas com um gritinho estridente; Michael morreu há muitos anos e foi substituído por outro cantor. A prova é que essa cópia andava para trás e gravou um clipe nos anos 80 ao lado do sósia de Paul McCartney, que morreu nos anos 60; Michael matou um de seus 593 sósias e veio para o Brasil. Vai morar no morro Dona Martha, em Botafogo. Ele teria comprado o lugar quando esteve por aqui. Por isso que não tem mais bandido lá, né?; por fim, Michael desistiu dessa vida de astro, tomou um remédio para virar negro e vai morar na Africa.
Todos os horrores da vida de Michael virão à tona e até o que nunca aconteceu vai se tornar a pura verdade. A infância brilhante e triste serão enfatizadas, o pai dele será execrado pelos maus tratos, os irmãs vão gravar um album ao vivo e cantarão junto ao brother famoso, que estará presente em um telão. Sem contar que paranormais começarão a receber mensagens em forma de sussurros e começarão a dançar freneticamente ans sessões espíritas.
Não é difícil imaginar que alguem um dia escreverá a peça: Esperando Michael. Afinal, ele será o elemento que estava para vir... Em seu lugar, teremos apenas a voz sepulcral e a gargalhada apavorante de Vincent Price pairando no ar.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

A TEORIA DA PREVISIBILIDADE

As pessoas poderiam evitar muitos problemas se usassem o artifício poderoso e totalmente eficaz da TP, Teoria da Previsibilidade.
Sua aplicação é simples, pois trata-se da utilização da fórmula: bom senso + noção de lógica. Vamos citar alguns exemplos:


O chefe convida a secretária para jantar num dia qualquer da semana pois tem assuntos da empresa que prefere conversar em particular. TP = 99% de possibiliade da noite terminar com um assédio sexual e/ou uma ameaça de demissão (no caso de uma negativa).


O noticiário da tv mostra uma cratera de 50 metros de diâmetro em uma rua de um bairro do subúrbio do Rio de Janeiro. Autoridades vão consertar o lugar em até 48 horas. TP = O buraco continuará aberto por meses, quando será feita uma nova reportagem. Depois continuará aberto, e depois.

Um candidato à presidência, oriundo das classes menos favorecidas, diz que nada vai mudar no seu modo de ser caso seja eleito. TP = Você nem vai reconhecer o homem depois da eleição.


O noticiário da tv mostra uma cratera de 50 metros de diametro em uma rua na zona sul do Rio, onde mora o governador do Estado. TP = o buraco será consertado em menos de uma hora e pessoas serão demitidas.

Uma famosa escola de samba carioca diz que vai entrar na avenida com um mega carro alegórico fantástico e extraordinário de cerca de 100m de comprimento e vai ‘quebrar tudo’, ganhar o carnaval etc. TP = o carro nem vai entrar na avenida porque vai enguiçar ou bater em alguma coisa e aí, sim, quebrar tudo. Por causa disso, a escola perderá vários pontos e cairá pra o grupo de acesso.

Flamengo contrata craque argentino que se apresenta na Gávea, beija a camisa, chora e diz que seu sonho sempre foi jogar nesse time. TP = alguns meses depois de não fazer gols o jogador será vendido para o Vasco da Gama. Lá, ele repetirá o discurso e o gesto.

Empresa diz que vai realizar uma reengenharia e dinamizar os serviços. Todos os funcionários serão beneficiados ao final do processo. TP = demissão em massa
Presidente da República vai a público e diz que um terceiro mandato é algo inimaginável. TP = algo inimaginável vai acontecer.

O ano de 2012 se torna ‘cabalístico’ por causa de uma profecia Maia. TP = autores que ‘acreditam’ no fim do mundo ganharão milhares de dólares com filmes, livros etc. Só não vão explicar o que farão com as fortunas já que planeta vai acabar.

Aviso sobre uma pandemia coloca o mundo em estado de alerta sobre a gripe súina, mas autoridades brasileiras afirmam que não há com o que se preocupar. TP = Hospitais não darão conta do número de infectados.

Polícia do Rio sobe um morro e mata dez pessoas. Segundo o porta-voz da corporação, eram todos traficantes perigosos. TP = È quase certo que o pipoqueiro da favela e o garoto de 2 anos não eram traficantes.

Atriz de 60 que pensa ter 20 é vista na noite com garoto e diz que está apaixonada. TP = Esse caso vai acabar em algum escândalo e ela continuará em evidência.

Escândalos envolvem ministros do Supremo, senadores e deputados: dólares na cueca, fazendas com trabalho escravo, nepotismo, compra de passagens irregulares com dinheiro público, contas secretas etc etc. TP = uma gigante de calabresa

quarta-feira, 24 de junho de 2009

"Acontece que essa vida por aqui pode ser bem divertida, de tão estranha que é!".

Algumas obras transcendem sua aparente limitação de tempo e espaço e ressurgem a todo momento como referência para filmes, séries de tv e mesmo debates filosóficos sobre a existência... é o caso de Alice no País das Maravilhas.
Para grande parte da população mundial que conhece a historia, Alice é uma obra destinada a crianças. Excetuando-se o fato da personagem principal ser uma menina, a história passa um pouco longe daquelas com finais felizes ou lições demoral. Alice é uma garota que não sabe quem é nem onde está... não há também um príncipe para resgatá-la... cada personagem que encontra pelo caminho faz menos sentido que o anterior... enfim: não é um conto de fadas.
O aspecto surrealista da aventura encerra uma série de assuntos que só fazem sentido à luz da filosofia, sobretudo a tentativa vã da descoberta do EU... afinal, quem somos? "Receio que não possa me explicar, Dona Lagarta, porque é justamente aí que está o problema. Posso explicar uma porção de coisas mas não posso explicar a mim mesma" diz Alice, numa das várias conversas quem tem com personagens bizarros. "Mas se eu não sou a mesma, a próxima pergunta é: Quem é que eu sou? Ah, essa é a grande charada." Outra sacada de Alice, que parece perceber não haver resposta apropriada que atenda a todas as expectativas. Sejam as nossas ou as do meio que nos cerca.
A filosofia e suas eternas questões, no entanto, são apenas a ponta do iceberg. Lewis Caroll construiu uma história que mexe com o tecido da realidade. Não se trata apenas de um sonho, como parece a um observador de superfície. Alice entra em um mundo em que faz a diferença, é o estranho elemento de mudança do lugar. Ela se dá conta de que pode fazer aparecer coisas, se movimentar naquele mundo com uma liberdade que não teria em outra realidade, como a que deixou acima. Inversamente proporcional, Alice descobre dentro da caverna o que os habitantes da mente de Platão descobriram fora da escuridão. É ali, nas trevas, que Alice percebe a liberdade, ainda que esta não seja exatamente algo que tivesse imaginado.
Famosas obras da cultura pop beberam dessa fonte com resultados extraordinários: MATRIX e LOST, por exemplo. Na primeira, Neo se vê obrigado a seguir o coelho branco, isso, no fim, o leva à libertação, ao nirvana. Em LOST, há inúmeras referencias, com destaque para uma cena, na quarta temporada, em que Jack, o médico, lê um trecho de Alice para Aron, seu sobrinho. Nesta série, os sobreviventes do avião se vêem em um lugar estranho, em que as leis da física não se aplicam o tempo todo. Mais, cada um quer descobrir quem é, na verdade. Em comum, essas produções trabalham conceitos de realidades alternativas. Ficção pura? Bem, não é o que diz a física quântica, que apresenta estudos científicos cada vez mais abalisados pela comunidade científica mundial. Caroll, talvez sem se dar conta, anteviu um mundo que fica mais estranho a cada dia.
Esse dois exemplos dão uma idéia da real profundidade em que a garota se mete ao seguir o coelho apressado. O leque de interpretações vai das análises da crítica social, da adolescência cheia de questionamentos, até o vasto universo que é a mente humana.


Leia e faça sua própria viagem.

quarta-feira, 3 de junho de 2009

NO AR, MAIS UM CAMPEÃO DE AUDIÊNCIA



A indústria da informação vive de grandes comoções, e se as atividades cotidianas de atrizes de 60 que pensam ter 20, políticos, os pequenos acidentes e delitos urbanos, alguns confrontos rurais (envolvendo o MST ou alguma tribo pseudo-canibal) e os gols da rodada fazem parte do cardápio trivial, algo como o acidente do vôo 447 da Air France é considerado como indicação do cheff.
O avião, recheado de brasileiros, franceses e outros passageiros, simplesmente ‘desapareceu’. Esse ingrediente é ainda mais apreciado por redatores e reporteres, que podem lançar mão de inúmeras atrações para o público, como gráficos e animações mostrando o que pode (ou não) ter acontecido, as rotas que o avião pode ter tomado, as hipotéticas decisões do piloto, as possibilidades de sobrevivência. Tudo que é impreciso começa a ganhar contornos dramáticos, especialistas em aviação, civis e militares, se tornam atores principais nos telejornais e criam teorias para explicar o que simplesmente não se sabe.
Um dia depois do acidente a notícia já deu lugar à pura especulação. Nada se sabe sobre o avião, não se sabe sequer o número exato de passageiros (este sim, um verdadeiro absurdo). Quem está no Brasil 'sabe' que havia 57 brasileiros, se estiver na França o número sobe para 58.

Não obstante, já se sabe quem estava a bordo, quer dizer, já se sabe quem era famoso, ou rico, e que estava a bordo, como membros do governo, representantes de grandes empresas e... um príncipe tupiniquim. A manchete de um dos jornais cariocas no dia seguinte era: príncipe brasileiro estava a bordo. Bem, nesse momento, quem acreditava que vivia em uma república se sente enganado.
A lista de passageiros não é divulgada pelos franceses, mas o resto do mundo sabe e divulga, o que torna a decisão francesa uma bobagem em tempos de comunicação em tempo real e imediato. Mesmo assim, os números não batem.
Os repórteres se amontoam aqui e na França, no intuito nobre de transmitir informações. Só que o espetáculo é mais interessante que essa escassez de fatos. Assim, programas especiais são gerados às pressas, parentes dos famosos desaparecidos são entrevistados, casos como o de um casal de idosos, que pretendia comemorar bodas em Paris, ganham ecos de personagens do Titanic, anônimos com história comovente é um prato cheio, sempre. Há também o caso de dois passageiros que vieram entregar doações para brasileiros necessitados e retornavam de sua missão humanitária (isso fez com que a comunidade do Orkut: bonzinho só se fode! ganhasse mais algumas dezenas de adeptos). Enfim, os passageiros receberam um inesperado upgrade em suas vidas, ainda que jamais quisessem algo assim.
Em terra firme, a imprensa descobre os ‘milagres’. Sim, pois há aqueles agraciados pelo destino, ou pelo que quer que suas religiões usem para explicar, pessoas que simplesmente perderam o vôo. OH!!! Um não embarcou porque o passaporte estava irregular, outro porque perdeu os óculos, aquele porque ficou entretido no aeroporto com a amante, e por aí vai. O fato é que se tornam também celebridades. Mais programas são montados para ‘explicar’ a razão desses ‘mistérios’ que salvam pessoas da morte certa. Não é dito que centenas de aviões decolam todos os dias, e na mesma proporção, inúmeros passageiros perdem vôos. Nesses casos, são demitidos por atraso, têm que se explicar com as esposas (ou maridos), perdem contratos importantes, aulas etc etc.

Em acontecimentos como o do vôo 447 existe, secreto, o desejo que a situação se perpetue por mais tempo, pelo menos enquanto durar a curiosidade mórbida-solidária do ser humano. Ao contrário de tsunamis ou outras catástrofes, um avião desaparecido impede ajuda feita através de depósito em contas-corrente, doação de alimentos e roupas (que serão desviados, também misteriosamente, no caminho) e deixa no ar a sensação de que ainda falta a sobremesa.
Afinal, o que terá acontecido ao vôo 447? Teóricos da conspiração sugerem um rapto; partidários dos grupos boderlines do 11 de setembro garantem que Bin Laden seqüestrou o avião para jogá-lo do meio do oceano, explodi-lo com ogivas nucleares e causar um maremoto para devastar alguma capital judaico-cristã; o pessoal da ufologia não têm dúvidas: foi abduzido, e nunca mais teremos notícias.
Na verdade, pilotos experientes dizem que passam por nuvens cumulus nimbus (agora todos sabem o que é uma, certo?) diariamente, e que uma aeronave tão tecnologicamente avançada como aquela, com uma tripulação tão qualificada, não seria pega de surpresa por descargas elétricas facilmente previsíveis. Bastava desviar de algumas nuvens cumulus (você ainda não sabe o que é??? Como assim?). Razões para não ter acontecido o que aconteceu não faltam, explicações pululam, a imprensa embevecida agradece a mais esse campeão (involuntário) de audiência.

No mundo real, longe das mídias e dos vampiros, famílias desesperadas, ávidas por notícias, olham para o céu e rezam a procura de alento.